segunda-feira, 21 de janeiro de 2013

A dinâmica das polaridades


A Gestalt terapia compreende o fenômeno humano de modo holístico. O homem é considerado como um todo unificado, um ser único e total, inserido em seu meio.
A Gestalt terapia critica a visão dicotômica e privilegia a visão holística. Na visão dicotômica o sujeito tende a perceber os aspectos diferentes de seu ser e do mundo de modo excludentes: ou se é isso, ou se é aquilo. A partir de uma visão holística, podemos perceber essas diferenças como aspectos de um mesmo fenômeno. Quando as diferenças são extremas, disse-se que são aspectos polares; como se determinado aspecto fosse caracterizado de modo gradual e pudesse se manifestar numa miríade entre dois pólos extremos. Os pólos não são excludentes, e sim complementares: são gradações máximas de um mesmo princípio. Um pólo, para sua existência, necessariamente requer a existência do outro pólo.
Esse modo de compreender a realidade faz com que o gestalt-terapeuta tenha uma visão bastante intrigante do processo de mudança. O Gestalt-terapeuta rejeita a missão de mudar, de transformar seus clientes. Quando o cliente está em conflito e procura ajuda para banir alguns aspectos de seu ser, quando sente que precisa mudar, o terapeuta ao invés de entrar no raciocínio normativo e excludente, ele assume uma postura de incentivar, acolher, dar voz e espaço aos aspectos alienados ou rejeitados que possam estar gerando sofrimento ao cliente.
Para a Gestalt terapia a neurose advém do raciocínio de excludência, onde o sujeito só pode se reconhecer de um modo (dentro de um padrão, de uma polaridade). A neurose advém da rigidez de sua percepção de si e do mundo, da dificuldade na reversibilidade no processo figura-fundo, na dificuldade de entrar em contato com suas necessidades e incômodos e de se comportar de modo congruente. Quando o indivíduo não atualiza sua existência, quando sua capacidade de entrar em contato com sua realidade é limitada, quando ele tem dificuldade em si conectar no aqui e agora, ele desenvolve uma percepção cristalizada de si e de seu meio. É essa cristalização que gera sofrimento e restrições, pois o sujeito vai perdendo sua capacidade ontológica de se atualizar.
O homem é um vir a ser, ontologicamente ele se caracteriza por seu devir, por sua capacidade de mudar, mas mudar no sentido de se atualizar. Deste modo, a Gestalt terapia entende a mudança como o processo em que sujeito se torna o que se é, atualizando sua existência. A mudança genuína só acontece quando o sujeito busca afirmar sua existência, quando busca se tornar o que se é e não quando tenta se converter no que não é. Eis o paradoxo da teoria da Mudança na Gestalt terapia.
Assim, a Gestalt Terapia preconiza o movimento da pessoa em direção a uma percepção mais fluida e ampliada de si mesma e de seu meio, preconiza o raciocínio mais integrado, menos excludente. Deste modo, fica mais fácil a pessoa tomar consciência de suas próprias contradições, de suas polaridades. O fato de conseguir enxergar em si determinada polaridade, mesmo que esta não o agrade, o possibilita entrar em contato com a mesma. Assim, ele pode interagir com esta polaridade, aprofundando nela e ampliando a consciência da mesma. Essa ampliação faz com que o sujeito transite, saindo da polaridade e experienciando diferentes nuances existentes num mesmo fenômeno. Esse trânsito potencializa e impulsiona a pessoa a exercer sua humanidade, caracterizada ontologicamente pelo devir.

Um comentário:

  1. Dra Alessandra, você consegue explanar seus temas com clareza e objetividade, mas sem a frieza da linguagem técnica, pelo contrário - com uma presença forte, que toca o leitor e o prende em seu enredo. Parabéns pelo blog!

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